Como as mensagens de texto mudaram nossas relações
Flávia Andrés Cataldo
Em junho último, a jornalista de multimídia Ankita Rao escreveu para o portal de ciência e tecnologia Motherboard (https://motherboard.vice.com) a respeito da influência do aplicativo iMessage nos relacionamentos e busca por namoros ou encontros românticos. Ela mostrou que o uso de programas de mensagem desse tipo – a exemplo do Whatsapp, líder no Brasil com 120 milhões de usuários – transformou significativamente o modo como nos comportamos e interagimos com outras pessoas.
Confira a seguir a tradução de alguns trechos do texto escrito originalmente em inglês e que aborda, de forma bem pontuada, hábitos que muitos de nós incorporamos e solidificamos ao longo dos últimos anos:
“Namorar hoje em dia é uma porcaria. Há, por exemplo, os paqueras que somem sem explicação – o chamado ghosting, em inglês. Há também pessoas desconhecidas que lhe enviam mensagens grosseiras e degradantes, em uma espécie de tentativa de conquista por intimidação – termo conhecido como negging. E há que se lidar com pelo menos cinco diferentes aplicativos (ou apps) de relacionamento no dia-a-dia. É uma vida difícil.
Pavani Yalla, líder de design experimental nos Estados Unidos, afirma que os elementos de comunicação visual dos aplicativos de mensagem são viciantes. Ela destaca os balões de fala, as animações de tela e o toque digital, diretamente focados em usuários jovens. A possibilidade de responder a mensagens com corações e polegares pra cima nos remete ainda – diz Yalla– às redes sociais nas quais já passamos várias horas por dia.
Há também as reticências animadas (“…”) e recursos similares que indicam que alguém está digitando, e o opcional sinal de visualização, que confirma quando alguém leu a sua mensagem.
São esses elementos que frequentemente injetam, em uma simples conversa, incríveis doses de ansiedade, frustração e autodesconfiança. E isso acontece, em parte, porque a comunicação por mensagens abre um grande espaço para mal-entendidos.
‘Especialmente quando uma das partes quer algo além de amizade, você não tem muito mais informações para se pautar além do tempo que outra pessoa levou para te responder’, diz Jeremy Birnholtz, pesquisador da Universidade de Northwestern, nos EUA. ‘Você irá se apegar a qualquer coisa que lhe pareça um sinal.’
As pessoas podem ainda se esconder atrás de mensagens de uma forma que não poderiam fazer pessoalmente ou pelo telefone. Nós muitas vezes usamos este novo escudo em benefício próprio, diz Birnholtz, seja para fingir que estamos ocupados ou para controlar o ritmo e a intensidade de uma conversa. ‘Sempre que houver uma ferramenta de comunicação, as pessoas poderão explorá-la’, explicou ele.
Mensagens de texto podem acelerar a experiência de um relacionamento ruim ou revelar as más intenções de alguém. Mas elas também podem proporcionar uma conversa positiva, e possibilitam que as emoções se esfriem após uma briga.
‘Não tenho dúvidas de que relacionamentos pioram com as mensagens de texto – alguns conflitos não podem ser resolvidos por mensagens’, afirma Birnholtz. ‘Mas também tenho certeza de que outros relacionamentos se fortalecem através delas.’”
- Flávia Andrés Cataldo é advogada e pesquisadora na área de Sociologia e Comunicação