Uma cidade à procura de um teatro
Às margens do Rio das Velhas, que sobrevive minguante aos sucessivos planos governamentais para sua revitalização, a cidade mineira de Santa Luzia luta para voltar a ter um teatro em sua região central, delimitada por um aconchegante centro histórico. Com 230 mil habitantes, o município conta apenas com um pequeno e pitoresco palco para espetáculos no distrito de Taquaraçu de Baixo, onde foi restaurado um teatrinho criado dentro do curral de uma fazenda.
A secretária de Cultura do município, Maria Goretti Gabrich Fonseca, tenta aprovar ainda em sua gestão um projeto de construção de um novo teatro no centro histórico luziense.
Em 1959, por razões obscuras, o teatro municipal da cidade, construído em 1825 em homenagem ao aniversário de D. Pedro I, foi posto abaixo para dar lugar a uma sala de cinema. Mais adiante, o mesmo prédio foi rebatizado como Teatro Antônio Roberto de Almeida. Anos de descuido e desgaste corroeram sua estrutura, a ponto de decidir-se por sua desativação.
O jornalista e escritor José Bento Teixeira de Salles, nascido em Santa Luzia, qualifica o ato de destruição do passado como “inexplicável” e lembra que o teatro representou, na época de seu pleno funcionamento, “um centro convergente de atividades literárias e culturais na região”. Ele acredita que os responsáveis pela administração da cidade no período em que o edifício foi demolido tomaram a decisão por não lhe reconhecer valor arquitetônico, deixando em segundo plano o seu inegável valor histórico.
Saraus literários e peças teatrais eram apresentadas com freqüência em suas dependências. O historiador Affonso Ávila chama atenção para a impropriedade de se comparar o antigo teatro de Santa Luzia ao de Sabará, um teatro elizabetano e que se integra ao contexto barroco. “É um certo exagero comparar com o teatro de Sabará”, afirma Ávila.
De qualquer maneira, com a autoridade de quem brincou em suas galerias quando criança, o escritor José Bento fala da graciosidade do teatro, construído com muita simplicidade e ancorado por pilastras de madeira. As imagens sobrevivem apenas na memória dos que o conheceram, já que não há registro fotográfico da parte interna do teatro.
Considerada uma área de entrada do sertão, Santa Luzia teve importante função viária no passado, quando o Rio das Velhas era navegável. A cidade abriga o primeiro colégio feminino de Minas, o convento de Macaúbas, fundado em 1714 e onde estudaram as filhas de Chica da Silva.
Em meio à tradição da cidade histórica, como atestam os nomes emblemáticos da Rua Direita e Rua do Serro, a prefeitura municipal defende a construção de uma estrutura moderna, capaz de abrigar qualquer tipo de espetáculo teatral.
No projeto apresentado ao Ministério da Cultura, como explica a secretária municipal, o pé direito do novo edifício comportaria os cenários mais arrojados e encenações com recursos tecnológicos de vanguarda. No novo teatro, se o projeto de sua construção tiver continuidade nas próximas administrações municipais, não haveria dificuldades para povoar seu palco.
A tradição cultural de Santa Luzia permanece viva. Nada menos do que 27 corais estão ativos na cidade. A maior parte é composta por corais religiosos, cultivados pela profunda tradição católica de Minas. Mas pelo menos sete deles se apresentam profissionalmente com sucesso.